terça-feira, 14 de outubro de 2008

One night @ Urgências

Batiam as 22h de sábado, e a Emília e eu, duas "desocupadas" por opção, entramos nas Urgências dos HUC, de bata vestida, estetoscópio ao pescoço, à procura da professora que nos iria "guiar" naquela maluqueira que ia ser o serviço de urgências daquele hospital.

Desnorteadas, perdidas e confusas, ansiosamente procuravamos o nosso lugar naquela sala cheia de macas, com gentes doentes (e pouco doentes) a gemer cada uma para seu lado à procura duma atenção que tinha de ser partilhada e rápida, porque naquele serviço trabalha-se e não é pouco.

Ainda na dúvida sobre qual a nossa verdadeira missão ali, fomos recebidas com um sorriso, que confesso, não estava à espera e foi-nos logo atribuído trabalho. Nada de especial, uma vez que a nossa experiência e o nosso conhecimento pouco ou nada nos permitiria fazer algo de extraordinário, mas o suficiente para nos sentirmos úteis. Pusemos em prática aquilo que aprendemos em algumas aulas e horas de estudo que, na altura, parecia em vão. Acima de tudo, acho que desenvolvemos as nossas capacidades de comunicação com os doentes. Percebemos que não é, muitas vezes, fácil lidar com as pessoas, que há alturas em que o trabalho é tanto e os doentes tão "absorventes" que não sabemos para onde nos virar e percebemos que há, acima de tudo, pessoas que nos surpreendem pela capacidade de resistência, pela serenidade que apresentam mesmo naquelas situações em que esperavamos uma reacção oposta.

Em todas as 5h lá passadas, senti-me integrada num grupo onde muitas vezes tenho dúvidas em pertencer. Desta vez senti-me incluída no grupo "Medicina". A professora (uma senhora, diga-se!!!), os internos, que não descuraram nunca da nossa presença ali. Muitas foram as vezes em que nos chamaram para nos mostrar as mais variadíssimas coisas: sopros no coração (ele estava lá, eu é que não o ouvi assim muito bem), manifestações de psoríase, enfartes do miocárdio e afins... toda uma panóplia de coisas que conhecia apenas dos livros. Confesso que nao esperava um tão bom acolhimento por parte dos médicos e, logo aí, a noite começou a ser entusiasmante e já só se pensava em repetir a experiência.

E, de facto, há pessoas que nos surpreendem: uma doente, que tinha tido um valente enfarte do miocárdio, altamente serena, que muitas vezes repetia que se sentia bem, que por ela ia já embora, que nos deixou "experimentar" os nossos poucos e limitados conhecimentos...enfim, uma heroína. E não me esqueço quando ela nos disse: " Minhas queridas, ninguém nasce ensinado!!!", porque eu achava que estavamos a incomodá-la, martirizá-la com tanta inexperiência...

Este foi o pequeno passo que, mais uma vez, me fez cair em mim e perceber onde estou e onde cheguei. Ali percebi que é disto mesmo que eu gosto. Ali senti-me "em casa". E, ali, senti que um dia vou ser feliz, por fazer aquilo de que tanto gosto e para o qual tanto trabalhei e trabalharei.

1 comentário:

Carlos disse...

e é por isso que gosto muito de ti

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=)